Considero-me uma trintona média, logo, representativa da Classe... mas posso estar enganada...

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Dez 08

 

Então passo a colocar aqui o que outrora apelidei de "festim de chocolate". É um bom retrato social dos nossas dias... Sei que foi publicado na Visão on-line, mas, lamentavelmente, não me lembro do nome de quem escreveu... As minhas desculpas!

 



«A criancinha quer Playstation. A gente dá.


A criancinha quer estrangular o gato. A gente deixa.

A criancinha berra porque não quer comer a sopa. A gente elimina-a da ementa e acaba tudo em festim de chocolate.

A criancinha quer bife e batatas fritas. Hambúrgueres muitos. Pizzas, umas tantas. Coca-Colas, às litradas. A gente olha para o lado e ela incha.

A criancinha quer camisola adidas e ténis Nike. A gente dá porque a criancinha tem tanto direito como os colegas da escola e é perigoso ser diferente.

A criancinha quer ficar a ver televisão até tarde. A gente senta-a ao nosso lado no sofá e passa-lhe o comando.

A criancinha desata num berreiro no restaurante. A gente faz de conta e o berreiro continua.

Entretanto, a criancinha cresce. Faz-se projecto de homem ou mulher.

Desperta.

É então que a criancinha, já mais crescida, começa a pedir mesada, semanada, diária. E gasta metade do orçamento familiar em saídas, roupa da moda, jantares e bares.

A criancinha já estuda. Às vezes passa de ano, outras nem por isso. Mas não se pode pressioná-la porque ela já tem uma vida stressante, de convívio em convívio e de noitada em noitada.

A criancinha cresce a ver Morangos com Açúcar, cheia de pinta e tal, e torna-se mais exigente com os papás. Agora, já não lhe basta que eles estejam por perto. Convém que se comecem a chegar à frente na mota, no popó e numas férias à maneira.

A criancinha, entregue aos seus desejos e sem referências, inicia o processo de independência meramente informal. A rebeldia é de trazer por casa. Responde torto aos papás, põe a avó em sentido, suja e não lava, come e não limpa, desarruma e não arruma, as tarefas domésticas são «uma seca».

Um dia, na escola, o professor dá-lhe um berro, tenta em cinco minutos pôr nos eixos a criancinha que os papás abandonaram à sua sorte, mimo e umbiguismo. A criancinha, já crescidinha, fica traumatizada. Sente-se vítima de violência verbal e etc e tal. Em casa, faz queixinhas, lamenta-se, chora. Os papás, arrepiados com a violência sobre as criancinhas de que a televisão fala e na dúvida entre a conta de um eventual psiquiatra e o derreter do ordenado em folias de hipermercado, correm para a escola e espetam duas bofetadas bem dadas no professor «que não tem nada que se armar em paizinho, pois quem sabe do meu filho sou eu».

A criancinha cresce. Cresce e cresce. Aos 30 anos, ainda será criancinha, continuará a viver na casa dos papás, a levar a gorda fatia do salário deles. Provavelmente, não terá um emprego. «Mas ao menos não anda para aí a fazer porcarias».

Não é este um fiel retrato da realidade dos bairros sociais, das escolas em zonas problemáticas, das famílias no fio da navalha? Pois não, bem sei. Estou apenas a antecipar-me. Um dia destes, vão ser os paizinhos a ir parar ao hospital com um pontapé e um murro das criancinhas no olho esquerdo. E então teremos muitos congressos e debates para nos entretermos.»

publicado por Trintona(inha) às 18:12
música: Alicia Keys - Superwoman (nova canção-fetiche)
sinto-me: +-
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8 comentários:
Olá

As perspectivas estão muito mal para as gerações vindouras. Eu tenho dois filhos e temo muito pelo futuro deles. Por eles e pelos contemporâneos deles. Por nós, que, em alguma altura, vamos ser cuidados por esta geração. Esperemos.

As pessoas perderam-se. Os avós já não participam na educação dos filhos. Quando participam na vida deles, rege-os a máxima de "os pais servem para educar, os avós para estragar"... Mas um dos problemas é que os pais também não educam... Os pais estão perdidos no que é "educar". Procuram, às vezes não muito conscientemente, "ajuda" nos locais errados. A televisão, os filmes, os anúncios... estão todos direccionados para vender, para o lucro. Ninguém dessa área vai ensinar os pais a dizer "não" às criancinhas. Seja a um pacote de gomas ou a um telemóvel topo de gama. Quando olham para o lado, vêm, ou pensam ver, os amigos a darem tudo às crianças. Tudo menos atenção, carinho, amor. E é precisamente pelo sentimento de culpa que sentimos que é mais fácil que eles nos manipulem.

Por mim, eu tento. Não digo que sou perfeita, já cedi à chantagem algumas vezes. Todos os dias os meus limites são testados por eles. Ela tenta ver até onde pode ir com uma mentira, ele até onde pode subir a uma cadeira, depois ao móvel, depois ao parapeito da janela. E todos os dias eu penso que ao mostrar-lhes que existem limites, estou a cuidar para que eles sejam pessoas adaptadas, correctas, felizes.

Falta-me aqui um pensamento que me ocorreu enquanto escrevia, mas... já se foi.

Beijo
Trintona(inha) a 1 de Janeiro de 2009 às 13:01

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